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Por
Rômulo Ruggeri
A temporada de 2019 de Daniel Jones trouxe alguns lampejos de brilhantismo e algumas situações de jogo que deixaram os torcedores um pouco preocupados. Analisar o quarterback do New York Giants é algo um tanto quanto complicado por tudo que envolveu a sua escolha no draft, a repercussão na mídia e, por fim, o seu desempenho em campo.
Contexto histórico de Daniel Jones
Antes de falar sobre a parte técnica, quero trazer algumas informações:
Universidade de Duke
“Danny Dimes”, assim apelidado pelos torcedores dos Giants, é um produto da universidade de Duke. Caso você não esteja familiarizado com a NCAA, a liga universitária de futebol americano, Duke definitivamente não está entre as universidades mais interessantes para se jogar (ao contrário do basquete) e é considerada como segundo escalão.
O reconhecimento dessa universidade é tão baixo que no mesmo draft de 2019 nenhum jogador de Duke foi selecionado além de Daniel Jones. Os analistas que acreditaram na qualidade de Jones indicaram que ele não teve números tão expressivos na sua carreira universitária muito por conta da falta de qualidade ao seu redor.
Outra questão interessante sobre Duke é que o técnico da equipe é David Cutcliffe. Cutcliffe tem, em seu currículo, o desenvolvimento de Peyton Manning na universidade de Tennessee e de Eli Manning na Universidade de Ole Miss. Arch Manning, sobrinho de Peyton e Eli e que recebe o mesmo nome do seu avô (que também foi QB na NFL), teve diversas propostas de universidades para este ano, inclusive de Duke, onde o HC é o “queridinho” da família Manning.
Draft 2019
O New York Giants tinha duas escolhas de primeira rodada naquele draft, nas posições 6 e 17. Depois de ter passado por um QB em 2018 para escolher Saquon Barkley na posição de número 2 (e receber muitas críticas por isso), a posição de QB era uma escolha mais do que óbvia para 2019.
Com a saída de Kyler Murray na posição 1 do draft para o Arizona Cardinals, Dwayne Haskins era a opção óbvia para os Giants na posição 6. Só que o óbvio não faz parte do currículo de Dave Gettleman e o General Manager dos Giants foi de Daniel Jones.
As críticas vieram novamente em 2019, pois aparentemente Jones era um jogador facilmente recrutável na posição 17 do draft e os Giants poderiam ter pego o pass rush Josh Allen. A justificativa dada por Dave Gettleman na época foi a de que haviam rumores sobre o time do Broncos ter o interesse em Jones na posição 10 e que ele havia oferecido uma troca com os Broncos para sair da posição 17 e assumir a posição 10 do draft. Segundo ele, a oferta foi recusada e posteriormente os Broncos acabaram trocando com os Steelers, que selecionaram Devin Bush na posição 10 (o que confirmaria a sua dúvida sobre o possível interesse).
A verdade é que nós nunca saberemos se isso aconteceu ou se foi apenas uma justificativa.
Desempenho de 2019 em números
12 interceptações e 18 fumbles (12 perdidos) em 12 jogos como titular. Começo com esses números pois, além de marcantes, eles realmente trouxeram alguma preocupação para a franquia e torcedores. É normal esperar que um QB calouro tenha certa irregularidade e erre bastante no seu ano de adaptação, mas os números negativos realmente foram alarmantes. Além disso, DJ sofreu 38 sacks e 119 QB hits (quantidade de vezes em que o QB sofre o contato logo após soltar a bola). É muita pressão.
Quanto à parte boa da temporada, Jones tem números bem expressivos. Ele atingiu a marca de 350 jardas aéreas e 5 touchdowns em uma única partida da temporada regular contra o time do Washington. Esse foi um feito realizado pela primeira vez na história da liga por um calouro. Além disso, um jogador novato conseguiu a marca de 300 jardas aéreas e 4 TDs em uma partida em apenas 4 vezes na história da NFL. Daniel Jones é responsável por 3 desses 4 jogos.
E para finalizar os números bons, DJ conseguiu terminar o ano com 3.027 jardas aéreas em 12 jogos e 24 TDs (3 a menos que o rookie recordista Baker Mayfield). Se você acha que esses números não foram bons, Kyler Murray, que jogou todas as 16 partidas como titular, terminou o ano com 3.722 jardas tendo 20 TDs e 12 INTs. Dwayne Haskins teve 7 jogos como titular e terminou o ano com 1.365 jardas aéreas, 7 TDs e 7 INTs. Ambos foram escolhas de primeira rodada junto com Jones.
Análise dos pontos fortes e fracos de Daniel Jones
Aqui pretendo mostrar alguns vídeos para que vocês vejam os pontos em que realmente preocupam em relação a Daniel Jones, assim como os pontos que indicam a qualidade e futuro brilhante que ele pode ter na NFL. Vamos iniciar pelos pontos que precisam melhorar.
Pressão no pocket
Esse é o primeiro ponto e um dos que mais preocupa em relação a Daniel Jones: na maioria das vezes, ele simplesmente parece não sentir a pressão chegando sobre ele. E isso talvez seja a grande questão a ser resolvida para quem precisa reduzir drasticamente o número de fumbles.
Nessa jogada contra o Arizona Cardinals, repare que Patrick Peterson deixa de marcar o WR dos Giants, deixando que o safety se encarregue da cobertura desse jogador e sai em direção a Daniel Jones. Veja como DJ, logo após o snap, já volta seus olhos para a secundária e rapidamente faz sua primeira e segunda leituras da jogada. DJ simplesmente ignora o seu ponto cego e rapidamente Peterson efetua o sack que resulta em fumble recuperado pelo time de Arizona.
Nesse próximo vídeo, vemos como o jogador dos Jets simplesmente arranca a bola das mãos de Jones enquanto ele procura pela melhor opção de passe. Novamente, ignora completamente a chegada da pressão agora do outro lado.
Coberturas em Zona
Jones teve muitas dificuldades em escolher a melhor situação de passe quando a defesa adversária apresentava cobertura em zona.
Na situação abaixo vemos o ataque dos Giants em um “personnel 11” na formação shotgun. Jones faz uma leitura pré snap e recua para iniciar a jogada. Repare que ao lado direito do ataque está Cody Latimer sendo marcado por Stephon Gilmore.
Ao iniciar a jogada, Latimer sai da marcação de Gilmore logo na jarda 25 e corre em direção ao centro do campo, isso brevemente antes de Jones decidir o lançamento. DJ decide então pela rota do TE porque, em sua leitura, Gilmore iria atrás de Latimer numa marcação homem a homem e aquele espaço ficaria aberto para a rota e recepção do TE.
Essa é uma jogada em que claramente DJ deveria ter optado pelo lançamento ao centro para seu RB ou para Latimer.
No vídeo abaixo, contra o Eagles, a mesma formação com rotas diferentes, mas o mesmo erro. Repare que os defensive backs recuam e os linebackers também recuam antes do snap. Isso é um indício de que virá uma marcação em zona para fechar o passe em profundidade, abrindo um grande espaço no meio com o Saquon Barkley. A escolha novamente foi a errada e mais uma vez tivemos uma intercepção fácil.
Apresentado aquilo que entendo ser seus maiores problemas, vamos para o que eu acho que fará de Daniel Jones um grande QB dessa liga.
Olhos sempre na secundária
Esse é um ponto que DJ faz com qualidade. Toda a jogada de passe ele está sempre focado na reação da secundária para encontrar o melhor caminho de atacar. Isso permite com que ele otimize o pouco tempo que tem para lançar a bola fazendo mais leituras da defesa e tomando a melhor decisão de lançamento.
Veja nesse próximo vídeo, em sua primeira partida na NFL. Logo após o snap, a pressão rapidamente vem do lado direito da sua linha. Daniel Jones, sem tirar os olhos do fundo do campo, se desloca levemente para o interior do pocket no intuito de reduzir o ângulo de ação do seu adversário e, consequentemente, ganhar mais tempo para lançar a bola.
Repare que esse segundo que ele ganha ao se movimentar permite que Slayton consiga avançar em sua rota o suficiente para virar a melhor opção de passe. Olhos na secundária é um item que vocês poderão reparar em outros vídeos aqui.
Rápidas leituras
Em todos os jogos dos Giants em 2019 nós vimos muitas dificuldades do quarterback calouro, mas vimos também muitas jogadas de qualidade.
Veja o lance abaixo em seu primeiro jogo na liga. O time está nas 7 jardas da linha de gol numa formação shotgun trips right e Sterling Shepard é o primeiro recebedor ao lado da linha ofensiva com uma rota corner. Do outro lado da linha está Evan Engram, numa rota quick out.
Repare que ao dar o snap, Jones procura primeiro Engram do lado esquerdo, percebe a janela fechada e busca seu novo alvo do lado direito. Shepard rapidamente sai para a lateral e tem seu marcador correndo atrás dele com a ajuda do safety, e ambos conseguem manter uma separação mínima de Shepard. Jones faz o lançamento em direção a lateral e consegue um passe espetacular.
Um pouco mais sobre as rápidas leituras
Veja agora essa jogada contra os Cardinals. O ataque está numa formação em shotgun tradicional, com Latimer e Tate do lado esquerdo e Slayton do lado direito. Latimer efetua uma rota double move em direção a sideline, Tate faz um movimento “bubble” para receber próximo da linha de scrimmage, se projeta para frente e Slayton efetua uma drag route.
Olhe para Jones e perceba seu olhar e sua postura corporal enquanto ele analisa a jogada. O primeiro olhar é para Latimer, mas marcação está em cima e automaticamente a leitura é Tate, mas o marcador está se projetando para cima dele.
Enquanto isso acontece, a linha ofensiva vai entrando em colapso pela parte de dentro e Jones precisa se projetar para o lado esquerdo e ganhar mais tempo. Logo em seguida ele faz a sua terceira leitura e efetua o passe para Slayton.
A leitura da posição da defesa também foi perfeita, pois Jones lança a bola baixa exatamente na janela entre Budda Baker e Patrick Peterson.
Liderança e mentalidade competitiva de Daniel Jones
Para ser um grande quarterback nessa liga, não basta ter qualidade dentro de campo, o atleta precisa ser grande também fora dele. Daniel Jones demonstra, até o momento, ter um perfil de liderança positivo frente aos seus companheiros. Sua aparente obsessão em ser sempre melhor apresenta uma mentalidade competitiva nem sempre vista, o que é muito interessante.
Bennie Fowler Jr, Wide Receiver que estava nos Giants no início do ano passado está escrevendo uma autobiografia e nela ele cita uma situação interessante. Depois de uma partida em que os Giants perderam, Daniel Jones ligou para ele enquanto jantava com seus pais para falar de uma jogada entre eles que poderia ter mudado o panorama da partida mas foi mal executada. Segundo Fowler Jr, aquilo incomodou tanto DJ que ele marcou um treinamento em um parque local. Ele e Fowler Jr foram lá apenas para eles repetirem aquele movimento algumas vezes e tentarem corrigir erros.
Daniel Jones, então, quer ser grande nessa liga e ele demonstra isso em diversos aspectos. Nessa offseason ele ligou para Tony Romo para pedir conselhos. O tema deveria ser muito provavelmente sobre Jason Garrett, que seria seu novo Coordenador Ofensivo. Jones treinou diversos dias com Cutcliffe para melhorar sua mecânica de passe e percepção do que acontece ao seu redor dentro do pocket. Ele trabalhou sua parte muscular para ficar mais forte e tentar, assim, perder menos a bola quando receber o contato. Jones também convidou inúmeros atletas para treinar com ele na offseason e melhorar assim a química de jogo. Enfim, o trabalho extra dele tem sido intenso.
Catchable pass
Este, de propósito, é o último item. Daniel Jones foi o 8º jogador que teve o maior número de passes capturáveis. Ou seja, passes que terminaram em drop ou de forma incompleta, mas que estavam na janela de recepção.
Essa é uma característica que deixa alguma dúvida ainda, pois ele consegue encontrar a melhor opção de passe e a execução na maioria das vezes não acontece de forma satisfatória (o que acaba “maquiando” a importância dessa estatística).
Foram 14 catchable passes. Uma delas foi uma Hail Mary e não conta para a estatística. Em três delas a bola estava na mão do recebedor e ele dropou. Em outros 10, a bola estava na janela de passe mas ele não foi perfeito para que o recebedor tivesse alguma chance.
Este item me deixa na dúvida sobre ser qualidade ou problema. É fato que errar os passes que ele errou nessas situações pode ser preocupante. Mas é fato também que em um ano de calouro erros são perdoáveis desde que ele apresente evolução.
O que esperar para 2020
Alguns especialistas americanos colocam Jones numa possível temporada de breakout. Outros já acreditam que ele é só mais um QB supervalorizado.
O fato é que essa será uma temporada de incertezas e adaptações, muito por conta da transição que o time passará com a sua nova comissão técnica. Além disso, os problemas que a pandemia trouxe à liga em termos de treinamento e jogos de pré temporada também serão sentidos. Por fim, as incertezas ainda rodeiam uma defesa extremamente jovem e desfalcada, o que poderá ser decisivo para muitas derrotas.
Para essa temporada, então, eu espero mais desenvolvimento de Daniel Jones como líder de um time que contou por 16 anos com a imagem Eli Manning dentro do vestiário. Além disso, gostaria de ver uma redução significativa no número de fumbles e que sua percepção dentro do pocket seja muito melhor. Por fim, acho que DJ terminará a temporada com um desempenho melhor em números do que foi a sua temporada de calouro. Ou seja mais jardas aéreas, mais TDs e menos turnovers.
(Foto: CBS Sports)
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